Vídeos elaborados pelo Ministério da Educação (MEC) que tratam de transexualidade, bissexualidade e da relação entre duas meninas lésbicas deverão ser debatidos em salas de aula do ensino médio no segundo semestre deste ano.
O objetivo do material, composto de três filmes e um guia de orientação aos professores, é trazer para o ambiente de 6 mil escolas o "tema gay" como forma de reconhecimento da diversidade sexual e enfrentamento do preconceito.
A proposta de exibir os vídeos nas escolas é um dos pontos polêmicos do Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (PNPCDH-LGBT) - um conjunto de diretrizes elaboradas pela Secretaria de Direitos Humanos, em parceria com entidades não governamentais, que visa a promover a cidadania e os direitos humanos da comunidade LGBT.
O PNPCDH-LGBT também prevê que se insira nos livros didáticos a temática de famílias compostas por gays, bissexuais, travestis e transexuais - ou seja, que os temas sejam incluídos nas ações de educação integral.
O plano contém 166 itens referentes a métodos de promoção, mobilização, conscientização e socialização das temáticas e demandas LGBT. Em discussão há três anos, o texto teve ideias mais radicais que acabaram deixadas de lado, como cotas para professores LGBT em programas de alfabetização. O documento deve ser finalizado e votado em dezembro, durante a Segunda Conferência Nacional LGBT.
Em relação à área de trabalho, por exemplo, há propostas como a criação de instrumentos para a profissionalização da população LGBT e para o acesso dos jovens de baixa renda a ofertas de estágio pago. É recomendado também "apoio à capacitação profissional para o grupo, com prioridade para travestis e transexuais, e suporte à inclusão desses jovens nos programas governamentais de capacitação".
Reações. A proposta de exibir os vídeos nas escolas tem provocado reações variadas, reacendendo o debate em torno da conveniência de levar o assunto para dentro das salas de aula. Em panfletos distribuídos em escolas do Rio de Janeiro, o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) alega que o MEC e grupos LGBT "incentivam o homossexualismo" e tornam "nossos filhos presas fáceis para pedófilos". "Querem, na escola, transformar seu filho de 6 a 8 anos em homossexual", diz o panfleto.
O deputado João Campos (PSDB-GO), da Frente Parlamentar Evangélica, diz não haver razão para que um público com certa orientação sexual tenha um tratamento especial nas escolas. "São privilégios. Por exemplo, a formação nas academias de polícia: por que não temos essa diretriz para um quilombola?", questiona Campos, citando a proposta de inclusão de temas relativos à diversidade sexual nos cursos de formação de policiais.
Privilégios. Para o jurista Ives Gandra Martins, alguns pontos do plano podem ser encarados como concessão de privilégios aos gays, bissexuais, travestis e transexuais. De acordo com ele, todas as garantias estão na Constituição e "não há por que exigir um tratamento diferenciado" (leia entrevista nesta página).
Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, entra no assunto buscando uma referência no debate, do final dos anos 80, sobre a conveniência da educação sexual nas escolas. "A convivência com a homossexualidade é uma convivência social. Estamos com o mesmo tipo de tabu da educação sexual de anos atrás, quando havia preocupação de que programas desse tipo causariam maior número de gestações na adolescência", disse Cara.
Para o secretário nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da Presidência da República, Ramaís de Castro da Silveira, a iniciativa de levar o debate à sala de aula tem como objetivo combater a exclusão histórica do grupo LGBT. "Visamos a não evasão escolar desses alunos. Hoje, 10% da população brasileira é gay", argumenta.
O MEC lembra que os vídeos serão "trabalhados em sala de aula" e seguem em análise na comissão da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do ministério.
Segundo pesquisa realizada pela Unesco, 39,6% dos estudantes de sexo masculino não gostariam de ter um colega de classe homossexual; 35,2% dos pais não gostariam que seus filhos tivessem um colega de classe homossexual; e 60% dos professores afirmaram não ter conhecimento suficiente para lidar com a questão da homossexualidade na sala de aula. Esses números, observa Daniel Cara, evidenciam a necessidade de falar sobre o tema nas salas.
Justificativa
DANIEL CARA
COORDENADOR-GERAL DA CAMPANHA NACIONAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO
"O fato de a homossexualidade já estar na rua, na televisão, mas não na escola ou no livro didático, acaba levando ao bullying."
Divulgação: www.jorgenilson.com
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