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10 de out. de 2013

As Convenções de Igrejas são Bíblicas?






As Convenções de Igrejas são Bíblicas?


                                                                Tim Wilson (*)

    Não é preciso que alguém tenha lido muitos livros sobre o assunto para compreender que a criação e a implantação de uma convenção (ou concílio) de igrejas é um assunto importante no chamado “movimento das igrejas domiciliares”.

    De fato, a maior parte das igrejas domiciliares com tempo significativo de existência concorda que o elemento isolado mais vital para a manutenção delas é uma convenção corretamente desenvolvida. Lois Barrett, autora de um popular livro sobre essas igrejas, declara que “uma coisa que todas as igrejas domiciliares têm em comum é uma convenção” (Building The House Church, pág. 29). Suas justificativas para as convenções são baseadas em três argumentos.

Argumentos Favoráveis às Convenções de Igrejas

    1. Nós entramos em relacionamentos regidos por convenções por comportamento padrão. Todos os grupos têm um senso de “agrupamento” que funciona em várias situações. Ainda que não escritas, essas orientações definem quem está no grupo, quais as exigências para entrada ou saída dele, como o grupo deve se relacionar e quais os comportamentos aceitáveis. O argumento é que, se essas referências existem de qualquer forma, é mais honesto e mais prático simplesmente esclarecer as expectativas em torno delas, discuti-las e então chegar a um consenso, com todos conhecendo as regras.

    Realmente é difícil negar a realidade desse argumento. A igreja domiciliar à qual eu pertenço não possui um rol de membros nem é filiada a qualquer convenção. (Porém, eu figuro na nossa “lista telefônica” de uma página só). De toda forma, a igreja às vezes parece empacada em certos assuntos sobre os quais existem fortes discordâncias. Uma convenção que estabelecesse claramente as áreas de tolerância e de intolerância certamente acalmaria alguns “eriçar de pêlos” que de  tempos em tempos são exibidos. O irmão “A” levanta um assunto que é considerado pelo irmão “B” como irrelevante. O irmão “A”, entretanto, acha que o caso é prioritário. O irmão “B” entende que não vale a pena tomar o tempo do grupo para a matéria e que ela não é edificante para todos. O irmão “A” justifica que o caso é edificante no sentido de que desafia algumas “vacas sagradas” do grupo. Essas situações podem ser tratadas tão logo se manifestem e resolvidas, se todos puderem perceber o que é esperado do grupo em tais casos.

    2. As fronteiras da convenção são livres ao estabelecer expectativas e direções. Assim, argumenta Barrett, não existe o senso de estar sem rumo. Ela dá ainda a seguinte explanação para demonstrar o problema existente por não haver  essas fronteiras: “O grupo inicial de pessoas que se reunia era diverso... não desejando ofender a ninguém, nunca se filiaram a nenhum concílio ou convenção... e as fronteiras não foram definidas. Em razão de não haver base para excluir ninguém, também não havia base para incluir a quem quer que fosse. O grupo se dissolveu depois de alguns anos, sem sequer haver se tornado uma igreja”.

    Esse argumento é também muito convincente. Em contato com alguns grupos de igrejas domiciliares, eu vi, muitas vezes, o problema da “exclusão”, quando ninguém se sente dentro - nem fora. Tenho também visto comportamentos que, em outros meios sociais seriam inaceitáveis, serem tolerados em igrejas domiciliares sob o pretexto de “fazer como Jesus teria feito” ou outra frase idêntica. Uma fronteira bem definida e divulgada certamente ajuda o recém-chegado a conhecer quando ele ou ela está no grupo e ao veterano a atuar como um mediador, encorajando a que o intolerável se torne mais aceitável. É muito difícil imaginarmos uma assembléia de pessoas realizando algo, por alguma razão, sem nenhumas “regras básicas” pelas quais se conduzirem quando na reunião. É difícil também para qualquer comunidade de pessoas se reunirem em eventos participativos freqüentes, sem a existência de um acordo sobre como cada uma deve se comportar.

    3. Convenção (ou pacto) é uma idéia básica da fé bíblica. Tanto o Antigo quanto o Novo Testamento expressam a relação da humanidade com Deus  em termos de pactos. Barrett mostra os três elementos essenciais de todas as convenções: 1)  A relação com Deus, 2) a submissão a outras pessoas da mesma convenção e 3) as relações com os que são estranhos à convenção. Trazendo  esses argumentos ao nível da igreja domiciliar, ela afirma que “essa forma de relacionamento é a típica de todas as convenções de igrejas domiciliares”. E então conclui, perguntando: “É realmente necessário escrever todas essas coisas específicas? Sim. Nós não vivemos nossas vidas totalmente no plano abstrato, em elevadas afirmações sobre um  compromisso final. Nós vivemos como cristãos na labuta diária, que precisa de estruturas para organizá-la e para tratar com o concreto e com o específico”.

Argumentos Contra as Convenções de Igrejas

    A declaração de Barrett de que “nós não vivemos nossas vidas totalmente no plano abstrato, em elevadas afirmações sobre um  compromisso final” teve um efeito chocante sobre mim. Isso parece dizer que a implicação oculta é que as injunções bíblicas não têm nenhum efeito prático na condição humana. Teriam as Escrituras se tornado, para nós, o “plano abstrato, em elevadas afirmações sobre um  compromisso final?” Se for assim, não me espanta que procuremos um pacto no nível humano, para substituir o que as Escrituras já não são mais aptas a fazer!

    Os argumentos contra as convenções estabelecidas entre as igrejas domiciliares começam com uma simples premissa – elas já estão em uma. É uma convenção coberta pelo sangue de nosso Salvador. Essa convenção não satisfaz a todos os três requisitos de uma convenção acima mencionados. Não se trata de inaugurar uma nova convenção, mas de dominar a realidade daquela na qual já estamos, o Novo Concerto (ou Testamento).

    O Novo Concerto é um acordo entre o Redentor e os redimidos. Esse acordo inclui: 1) o tema fundamental do nosso relacionamento com Deus, 2) nossa vida com nossos companheiros redimidos e 3) nossa relação com os outros não pertencentes ao Concerto, os vizinhos, os inimigos ou o mundo todo.
    As relações do povo do Antigo Testamento com o seu Pacto são de grande ajuda para entendermos o dinâmico relacionamento dos seres humanos em um concerto originado de Deus. Imagine as crianças de Israel criando, elas mesmas,  uma convenção humana de forma a melhorar sua obediência à convenção criada por Deus. Pense na resposta de Deus a isso! Precisaria ser uma resposta definitiva à convenção. Ela estaria, entretanto, além do entendimento de um credo humano. A base de toda relação numa convenção é a simples presença do Criador original nela própria. No Novo Testamento nós temos uma refeição – e não uma simples refeição! No evento ordinário de comer, nós encontramos o evento extraordinário do convênio. Nós nos tornamos participantes de algo que é muito maior do que nós – muito grande para ser posto numa garrafa, escrito num credo ou rubricado por um subgrupo.

    Nós podemos, razoavelmente, esperar que o evento da refeição pactual exerça uma influência efetiva na igreja? Claro que podemos! Enquanto que a descrição da Ceia do Senhor em 1 Coríntios 11 é frequentemente usada como “padrão” para a igreja, pode ser entendido que Paulo a estava usando para levar os geniosos coríntios à obediência. O problema não era que eles precisavam ser relembrados sobre como comer a refeição. O problema era que eles estavam tratando a refeição como um  ato sem propósito. Paulo os relembra então que a refeição era parte de um pacto (verso 23), era uma representação da pessoa e da obra de Cristo e era a proclamação de Sua morte (e, por conseguinte, de sua participação nela!) até que Ele volte (verso 26)! Evidenciar a força ética da refeição foi clara pretensão de Paulo, com os objetivos de: 1) parar a disputa, 2) acabar com as divisões e 3) avisar que, se a determinação fosse ignorada, isso resultaria em julgamento com conseqüências chegando até a morte física. Esse pacto de que Paulo falava era inteiramente prático, específico e concreto. Até hoje, esse pacto não mudou! Se houve alguma transformação, foi de nossa parte. A solução é sempre a mesma: arrependimento, confissão, perdão e uma vida na nova luz. A solução não é criar uma nova convenção, da qual derive nossa ética.

    Considere Gideão, após sua magnífica vitória (Juízes 8:22-23). O povo pedia: “Domina sobre nós, assim tu, como teu filho, e o filho de teu filho; porquanto nos livraste da mão de Midiã”, Gideão, contudo, escolheu ficar “no plano abstrato, em elevadas afirmações sobre um  compromisso final”, pelo que respondeu: “Nem eu dominarei sobre vós, nem meu filho, mas o Senhor sobre vós dominará”.
    Considere quando os anciãos se reuniram com Samuel dizendo: “Constitui-nos, pois, agora um rei para nos julgar, como o têm todas as nações” (1 Samuel 8:5)  e “... haverá sobre nós um rei, para que nós também sejamos como todas as outras nações, e para que o nosso rei nos julgue, e saia adiante de nós, e peleje as nossas batalhas” (1 Samuel 8:20). Desta vez, foi Deus pessoalmente que escolheu estar “no plano abstrato, em elevadas afirmações sobre um  compromisso final”, pelo que disse a Samuel: “Ouve a voz do povo em tudo quanto te dizem, pois não é a ti que têm rejeitado, porém a mim, para que eu não reine sobre eles” (1 Samuel 8:7-8).

    Em ambas as circunstâncias acima, as pessoas poderiam negar que, desejando um rei, estariam rejeitando o Rei dos Reis. Não há dúvida que elas poderiam argumentar que eram apenas pessoas comuns, “na labuta diária, que precisa de estruturas para organizá-la”, que precisam de um rei  “para tratar com o concreto e com o específico”, como as julgar e ir à sua frente nas batalhas. Eu poderia também assumir que, nos nossos dias, pessoas que defendem as convenções de igrejas poderiam negar que estejam rejeitando o Autor da Convenção.  Não obstante, o efeito prático é o mesmo. Assim como o povo começava a absorver a lei a ética de um rei humano, nós podemos, criando uma convenção de igrejas, ter nossas leis e nossa ética originadas de um pacto humano e não do Concerto de Cristo. Não há dúvida de que a reação a esta declaração será que, na maioria dos casos, estaríamos tratando de atividades de convenção muito simples. Não obstante, alguém que pense que isso está indo muito longe, teste seu argumento contra a declaração do Senhor sobre o desejo de Israel de ter um rei.

    Porém, nós temos um Deus que está próximo. Um Deus muito zeloso disso: nós temos um tratado com um Grande Deus. Esse tratado, chamado de convenção (ou pacto) foi elaborado pelo Rei pessoalmente. E se esse Rei foi zeloso com seu povo e de sua fidelidade à Antiga Convenção (ou Antigo Pacto) que Ele mesmo apresentou, quão mais zeloso Ele seria se vemos que o  Novo Testamento, o qual foi originado do filão de Emanuel, é muito no “plano abstrato”.  Quão terrível é um pensamento que conclua que o Novo Testamento não é convincente, não é prático, é abstrato “em elevadas afirmações sobre um  compromisso final” e que uma convenção menor, não originada no sangue humano, é mesmo considerada necessária!

    Embora isso seja de pouca valia para equilibrar o argumento acima, é importante que se note que essa objeção ao processo de convenção da igreja não é uma objeção ao processo de tomada de decisões na igreja. Talvez a razão pela qual as igrejas domiciliares escolheram entrar numa convenção seja uma distorção do entendimento do papel dinâmico que nosso Senhor deu à igreja. Nosso Senhor chamou Sua igreja para o papel de “ligar e desligar” em Seu Reino (Mateus 16:19 e 18:18).

    No Antigo Testamento, juízes foram designados para tomar decisões judiciais. Decisões referentes a pecados, desacordos, casamentos, práticas e um elenco de outros assuntos que dizem respeito a todos os crentes de todas as idades. Cristo deu ao Seu povo o direito e a obrigação de fazer julgamentos. É nossa incumbência cumprir o papel de juízes dentro da igreja (1 Coríntios 6:1-7). Existem aqueles que precisam ser removidos do nosso meio (1 Coríntios 5:1-8); existem outros que devem ser ignorados após duas ou três advertências (Romanos 16:17-19, 2 Tessalonicenses 3:6 e 3:14-15 e Tito 3:10-11). Há ainda aqueles aos quais deve ser mostrado um mais excelente caminho. Existem também ações que tratam de necessidade momentânea ou da fome física em outra igreja localizada em outro lugar (Atos 11:28-29). Em todas essas coisas, nós somos chamados a ser dinâmicos como cristãos. Se formos dinâmicos na área de tomar decisões (judicialmente) e nos mantivermos estáticos na área de entrar em convenções (legislativamente), nós responderemos ao pacto de nosso Senhor como Ele pretendeu que o fizéssemos.

    A avaliação do problema, como feita por Barrett e outros, é válida. Meu argumento é apenas contra a solução sendo uma convenção de igrejas. Nós pisamos em Solo Sagrado quando procuramos “executar um conjunto de orientações” e “estabelecer as expectativas e as direções do grupo”. Se nosso Rei já estabeleceu de fato nossa convenção, então já temos todas as coisas necessárias nas orientações existentes, para atuar conforme as expectativas e as diretivas Dele. Se essa idéia é muito elevada e irrealista para nós como cristãos, então o problema é a nossa falta de valorização   para o que temos no nosso Novo Concerto. Vale a pena repetir que a solução para o problema que Barrett levanta com seus argumentos é: arrependimento, confissão, perdão e um viver na nova luz. A solução não é a edificação de um uma nova convenção da qual derive nossa ética.

Conclusão

    A afirmação de que as igrejas domiciliares devem concordar em juntar-se numa convenção, como fundamental para elas, é uma premissa falsa e mal orientada. Essa conclusão foi criada em oposição à maré do “movimento das igrejas domiciliares”. Qualquer igreja que esteja considerando uma convenção ou já faça parte de uma, deve refletir profundamente sobre isso. Uma convenção de igrejas se tornará um padrão ético para seus participantes. Uma ética impropriamente escolhida é, realmente, ética ruim. Eu não tenho dúvida de que igrejas que estejam em convenções provavelmente cresçam mais, pelo menos falando humanamente. Entretanto, é assustadora a possibilidade de que o vento do Espírito não permaneça muito tempo soprando no meio do povo que as compõem. Isso, talvez, por estarem inconscientes desse processo, devido ao fato de que, agora, a sensibilidades deles esteja voltada à  convenção de criação humana e não mais às orientações do Espírito, que imprime o concerto de Cristo no coração do homem.

                                                                                      Tradução de Otto Amaral


(*) Tim Wilson  cresceu nas savanas selvagens da África como filho de missionário. Ele voltou aos Estados Unidos para cursar o colégio e estudou no Tennessee Temple, perto de Chattanooga, Tennessee. Tim vive de seu negócio de seguros e está envolvido com as igrejas domiciliares na Costa Oeste desde muitos anos.

Fonte: Restaurar

Divulgação: www.jorgenilson.com

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