Morre conceituado tradutor da Bíblia
A Sociedade Bíblica do Brasil (SBB) manifesta seu imenso pesar pela morte do Eugene A. Nida, ocorrido na quinta-feira, 25 de agosto, em Bruxelas, na Bélgica, aos 96 anos. Grande expoente da tradução da Bíblia no século 20, Nida, por mais de 50 anos – a partir de 1943 –, coordenou o programa de traduções da Sociedade Bíblica Americana. Posteriormente, foi o mentor do programa global de traduções das Sociedades Bíblicas Unidas, além de consultor a serviço dessa organização.
“Vai-se talvez o mais influente tradutor da Bíblia de todos os tempos! Milhões de pessoas tiveram acesso à Palavra de Deus, graças a ele”, ressaltou o diretor executivo da SBB, Rudi Zimmer.
Eugene Nida será lembrado principalmente pela revolução que promoveu no âmbito da tradução bíblica, em meados do século 20. O impacto que isso teve sobre o crescimento e o desenvolvimento da Igreja cristã continua a ser sentido ainda hoje, na medida em que milhões de pessoas em centenas de línguas, em todo o mundo, tiveram acesso à Bíblia graças ao método que ele desenvolveu e disseminou.
Valendo-se de conceitos tirados da Linguística, das Ciências da Comunicação e da Psicologia, além de estudos culturais, Nida desenvolveu um enfoque ou método prático de tradução, que ele chamou de equivalência funcional ou dinâmica. Seu objetivo era tornar a tradução clara e compreensível, sem que perdesse a exatidão. Mas a contribuição dele não se limitou à tradução da Bíblia. Nida influenciou também o campo da Ciência da Tradução, que teve origem em sua época. Ele é visto como o homem que deu o pontapé inicial, que levaria ao desenvolvimento dessa disciplina.
Por meio de numerosos livros, artigos e inúmeras palestras, Nida pôde ajudar estudiosos, tradutores e especialistas a encontrar novas formas de comunicar-se de forma eficaz. Seus livros Toward a Science of Translating (Com Vistas a uma Ciência da Tradução), de 1964, e Theory and Practice of Translation (Teoria e Prática da Tradução), de 1969, foram traduzidos para várias línguas e, ainda hoje, são ferramentas essenciais para tradutores da Bíblia. Devido ao seu trabalho acadêmico, sua influência ultrapassou o campo da tradução bíblica influenciando a área da tradução como um todo.
Nida cursou a Universidade da Califórnia, Los Angeles (UCLA), formando-se em 1936, tendo o Grego como área de concentração e o Latim como área complementar. Obteve uma das mais altas avaliações na história dessa universidade. No verão que se seguiu à sua formatura, Nida se preparou para começar um trabalho missionário de cunho linguístico com a organização que se tornaria o “Summer Institute of Linguistics” (Sociedade Internacional de Linguística – SIL). Um pouco mais tarde, começou a trabalhar com a língua Taramuhara, no México. No entanto, por problemas de saúde teve de retornar à Califórnia. No período do verão, continuava a treinar tradutores para SIL. Ao mesmo tempo, deu início a seus estudos de pós-graduação, concluindo o mestrado em Grego do Novo Testamento, em 1939, na Universidade do Sul da Califórnia, e o doutorado em Linguística, na Universidade de Michigan, em 1943.
Parceria duradoura
Em 1943, passou a trabalhar para a Sociedade Bíblica Americana. Não demorou muito para começar um intenso programa de viagens para ajudar tradutores da Bíblia em todas as partes do mundo. No Brasil, acompanhou o trabalho de revisão da tradução de Almeida, que culminou na publicação da Almeida Revista e Atualizada. Aos poucos, foi desenvolvendo o método da equivalência funcional. Nida se comunicava com extraordinária facilidade e conseguiu mostrar a tradutores, com os mais variados níveis de formação, como poderiam usar o método de tradução que ele desenvolveu. As traduções que resultaram disso eram ao mesmo tempo exatas, do ponto de vista exegético, e compreensíveis para o leitor.
Seu método fez com que a Bíblia se tornasse disponível e acessível numa escala nunca antes vista. Isto vale tanto para línguas da Ásia, África e América Latina, para as quais a Bíblia nunca antes havia sido traduzida, bem como para o inglês e outras línguas mais conhecidas, que já têm uma longa história de tradução bíblica. Exemplos disso são a “Good News Translation”, a “Contemporary English Version”, bem como a Nova Tradução na Linguagem de Hoje. Mas outras traduções, como a Nova Versão Internacional e a Nova Bíblia de Jerusalém, também revelam influência do tradutor.
Quando, em 1946, várias Sociedades Bíblicas locais decidiram trabalhar em conjunto e formar as Sociedades Bíblicas Unidas (UBS), Nida se fez presente na reunião em que essa organização foi fundada e, posteriormente, se encarregou de formatar os projetos de tradução dessa nova organização.
Nida sabia que os tradutores da Bíblia precisavam ter acesso às melhores edições dos textos originais e foi assim que tomou a dianteira em projetos tanto para o Novo Testamento Grego quanto para a Bíblia Hebraica. Disso resultou a publicação de O Novo Testamento Grego das Sociedades Bíblicas Unidas – hoje na quarta edição revisada, com uma edição em português publicada no Brasil –, que é a edição mais usada por estudiosos e tradutores em nossos dias, bem como o desenvolvimento do Hebrew Old Testament Textual Project [Projeto do Texto do Antigo Testamento em Hebraico], que ajuda os tradutores a entender mais de 6 mil problemas textuais relacionados com o texto hebraico.
Ele inovou também no campo da lexicografia, na medida em que desenvolveu uma nova maneira de fazer um dicionário do grego do Novo Testamento. Trata-se do Dicionário Semântico, baseado em domínios ou campos semânticos, que são áreas de significados relacionados entre si. Nesse dicionário aparecem, não as palavras ou os equivalentes de tradução em ordem alfabética, mas os significados, que são agrupados por campos semânticos. Esse dicionário é de imenso valor para os tradutores, na medida em que ajuda a distinguir entre os diferentes significados de uma mesma palavra.
Nida teve seu trabalho reconhecido em várias ocasiões tanto pela Sociedade Linguística Americana (da qual foi presidente em 1968) como pela SBL (Society of Biblical Literature). Recebeu vários títulos de doutor honoris causa bem como outras homenagens de instituições de ensino de todo o mundo.
Seu legado continua através do “Eugene Nida Institute for Biblical Scholarship” da American Bible Society.
Nida foi casado por cinquenta anos com Althea Lucille Sprague Nida, que faleceu em 1993. Algum tempo depois, Nida conheceu a Dra. Elena Fernandez-Miranda, renomada tradutora e intérprete, com quem casou em 1997.
Fonte: Philip C. Stine, com tradução de Vilson Scholz. Philip Stine atuou no Departamento de Traduções da UBS de 1984 a 1998. Antes disso, de 1968 a 1984, havia sido consultor de traduções e coordenador regional da UBS na África.
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